Os varejistas que possuem lojas em shoppings estão preocupados: desde o começo do ano, estão recebendo comunicados dos estabelecimentos informando que serão instalados softwares, em seus caixas, de controle de faturamento. “Meus clientes começaram a pedir se deviam assinar o documento solicitado pelos shoppings, que os pressionavam a aceitar a nova medida, alegando que seus contratos permitem a fiscalização do faturamento por parte do shopping, com finalidade de cálculo de aluguel”, explica Thaís Kurita, advogada especializada em Varejo, sócia do Novoa Prado Consultoria Jurídica.
Apesar de o shopping realmente ter o direito de averiguar se o lojista está informando corretamente o valor de seu faturamento para cálculo do aluguel cobrado, esse controle não pode ser abusivo e nem ferir o direito constitucional de sigilo de dados do varejista e de seus clientes, conforme a advogada.
“Em primeiro lugar, o shopping não pode ter como regra que todos os lojistas agem de má-fé. Se há alguma desconfiança, é possível que se implantem auditorias naqueles estabelecimentos nos quais há informações díspares. Depois, não é possível determinar exatamente quais são os dados aos quais os shoppings terão acesso. A ideia é que eles conheçam apenas o faturamento bruto, mas, acessando o caixa, sabe-se a margem de lucro aplicada, o valor pago por cada item comercializado, as comissões, a folha de pagamento, os dados cadastrais dos clientes e os programas de fidelidade, entre muitos dados estratégicos da empresa que, se vazados, são prejudiciais ao mercado”, alerta a advogada.
Thaís Kurita explica que a quebra do sigilo de dados só ocorre em hipóteses restritas, como no caso de ordem judicial ou questões de segurança pública, sendo esse sigilo assegurado pela Constituição Federal de 1988, Artigo 5º, inciso XII:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(…)
XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
Para a advogada, portanto, o lojista não é obrigado a ceder seus dados para o shopping, continuando à disposição caso o estabelecimento deseje realizar uma auditoria tradicional em seu estabelecimento, cumprindo o que versa em seu contrato.
Lei Geral de Proteção de Dados
Thaís Kurita lembra que, em 2020, entrará em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados, que agravará ainda mais o solicitado pelo shopping. A referida Lei visa proteger os dados e a privacidade dos cidadãos. Com a integração do sistema pelo shopping, além dele ter acesso a todos os dados e informações do lojista, ele também terá informações pessoais de seus consumidores.
Tal lei veda o uso indiscriminado desses dados pessoais e não permite o compartilhamento para terceiros sem a respectiva autorização. Isto porque a lei, ainda, exige que os dados sejam coletados apenas com o consentimento daquele cidadão e que haja expressamente descrito qual o tratamento será dado para esses dados. Ou seja, não é possível utilizar os dados para fins diversos ao descrito na autorização consentida por aquela cidadão. “A inobservância do previsto nessa lei pode ensejar em multas altíssimas e, em caso de danos provocados ao titular dos dados, a responsabilidade é solidária entre os agentes que tiveram acesso a esses dados. Será preciso cuidado redobrado”, finaliza a advogada.